Ultimamente tenho pensado bastante na situação da divulgação científica brasileira, ainda mais depois que comecei o podcast e meu blog pessoal. E o principal nome a respeito do tema que me vem à cabeça é o do físico brasileiro Marcelo Gleiser. Eis que num belo dia, folheando uma edição da revista Pesquisa FAPESP, nas suas últimas páginas, me deparo com a seção “Resenhas”. Uma das resenhas tinha um título que me chamou a atenção; “O dia seguinte ao bóson de Higgs” e o autor da resenha era o jornalista científico Salvador Nogueira.
A resenha escrita pelo Salvador Nogueira era sobre o livro “O Cerne da Matéria” do autor Rogério Rosenfeld, físico brasileiro que esteve presente no CERN (European Organization for Nuclear Research) no ano de 2012 e acompanhou os últimos acontecimentos até o anúncio oficial da descoberta do bóson de Higgs. Para minha surpresa, uma agradável surpresa, encontro mais um livro de divulgação científica escrito por um cientista brasileiro, e em uma grande editora como a Companhia das Letras.
O objetivo principal dessa resenha não é explicar o que é o bóson de Higgs, suas propriedades, quem o teorizou ou as controvérsias do apelido “Partícula deus”, mesmo porque, eu não teria tanta propriedade para tal. Espero conseguir despertar o interesse de vocês para uma da maiores descobertas do início do século XXI.
O ano de 2012 foi um ano fantástico para os amantes da ciência. No dia 4 de julho foi anunciado a descoberta do bóson de Higgs, importante componente da partícula de Higgs, responsável por dar massa a tudo que existe no universo. Temos que destacar o quão grande e importante foi essa descoberta. Além de todo desenvolvimento tecnológico que acompanhou a busca pelo bóson de Higgs, agora temos conhecimento das estruturas mais fundamentais que compõem nosso universo. Se um dia acreditamos que o átomo era a partícula elementar e indivisível, o que acabou se mostrando errado, atualmente podemos afirmar com um grande grau de certeza que conhecemos a maioria das partículas elementares.
Os ouvintes que acompanham o Dragões de Garagem já estão cansados de saber e não é novidade alguma o quanto gostamos daquela contextualização histórica. E é exatamente isso que o Rogério faz no livro todo. Começando pela criação dos primeiros aceleradores de partículas, que cabiam na palma das mãos de Ernest O. Lawrence, passando pela relação do Brasil com as pesquisas em física subatômica, os trabalhos de Cesar Lattes e nosso quase prêmio Nobel, a criação de centros de pesquisa em nossas universidades, e a situação atual dos nossos aceleradores.
Ele também nos conta como aconteceu a criação do CERN e cada um de seus momentos. A construção dos aceleradores: PS (Proton Syncroton), SPS (Super Proton Synchrotron), SPPS (Super Proton-Antiproton Synchrotron), LEP (Large Eletron-Positron Collider) e finalmente o LHC (Large Hadron Collider), a constante disputa com os Estados Unidos para ver quem possuía o maior e melhor acelerador de partículas, a criação da internet, a world wide web (www), em 1989 para melhorar a comunicação e transferência de informações dentro do CERN e muitos outros. Eu poderia citar vários acontecimentos importantes, mas vou deixar vocês irem atrás e se divertirem com o livro.
A partir da história da criação dos primeiros aceleradores de partícula, da descoberta de novas partículas, de problemas políticos, econômicos e das grandes guerras, de avanços científicos e tecnológicos, da construção de um acelerador de partículas com quase trinta quilômetros de circunferência e finalmente da descoberta do bóson de Higgs que o autor explora e elucida de forma magistral em seu livro.
O livro possui uma leitura agradável, os capítulos são pequenos e estão separados pelos assuntos em discussão, não seguindo uma ordem cronológica. Confesso que algumas vezes me perdi nas datas, mas no final compreendi o porquê de organizar o livro dessa forma e gostei. As pessoas que estão no meio científico irão se identificar muito com o livro e provavelmente se sentirão motivados a continuar nessa carreira. Quem não está, terá um vislumbre de como a ciência funciona, seus métodos, problemas e as pessoas que estão por trás. Quem sabe também se motivem a entrar nessa carreira e nos ajudar na busca por novos conhecimentos. Como dito pelo Rogério no epílogo do livro: “Apesar dos enormes avanços em nosso conhecimento, sabemos que ainda não sabemos muita coisa, e novas revoluções científicas com mudanças de paradigma podem estar no horizonte”.
Luciano Queiroz é mestrando em Microbiologia pela Universidade de São Paulo e host do podcast Dragões de Garagem. Atualmente planejando quais serão os próximos passos do seu mestrado.
Mais informações:
“O Cerne da matéria: A aventura científica que levou à descoberta do Bóson de Higgs”, Rogério Rosenfeld, São Paulo: editora Companhia das Letras, 1a. edição (2013), brochura 14×21 cm., 212 págs., ISBN: 978-85-359-2346-9
Outras resenhas: Beco das palavras e Livros que eu li;
Entrevista do Rogério Rosenfeld ao Canal Livre (Muito boa);
Notícia sobre o livro na Folha de São Paulo
Episódios do Dragões de Garagem:
#24 – Modelos atômicos
#25 – A ciência de Mass Effect (falamos pouco)
Agradecimentos especiais ao Lucas Camargos pela leitura e críticas enriquecedoras ao texto.